A perda de um filho, o sofrimento e o isolamento provocados pela Covid-19 e mais a violência obstétrica. Foi o misto de tudo isso que sofreu a indígena India Mbotyra Tupã (Jacieli Pego Ramos Bolonese) no último final de semana. O fato colocou holofote em um problema social que vivem as aldeias indígenas de Aracruz.
O descaso vivido pela tupiniquim no Hospital São Camilo, que teria entregue à família os restos do aborto espontâneo em um frasco de soro, deixa à mostra a discriminação e a violência obstétrica, que foi, inclusive, tema de debate na Câmara de Vereadores.
O “basta” chegou na voz do seu marido David, que utilizou sua rede social para publicar um vídeo emocionado e carregado de revolta com a forma como sua mulher foi tratada no lugar em que deveria ter sido acolhida.
“Não sabemos se podemos enterrar”, foi uma frase usada pelo David para sinalizar sua dúvida em relação ao que havia acontecido no hospital.
O vídeo circulou as redes sociais e chamou a atenção, inclusive, da imprensa nacional.
Em postagem da India Mbotyra em sua rede social, a professora Celeste Ciccarone expõe o problema vivido nessa pandemia pelos povos indígenas. “Até o mês passado o único apoio da Secretaria de Saúde de Aracruz para controle da pandemia nas aldeias tem sido a doação de máscaras”.
O hospital, em nota, afirma que entregar o feto em frasco improvisado não é uma prática comum, e sim, “um fato isolado”. “Abrimos uma sindicância interna para apurar os fatos, para tratarmos da melhor maneira possível”.
Ainda de acordo com a nota do Hospital, o material coletado após um aborto é liberado junto com os pacientes, conforme orientação da Prefeitura. “Porém, diante desse desafio, a direção do Hospital fez um realinhamento com a Secretaria Municipal de Saúde para que o material coletado ou recebido pela instituição seja encaminhado diretamente para a Casa Rosa”.
Também por meio de nota, a Secretaria de Saúde de Aracruz informou que encaminhou uma equipe ao Hospital São Camilo assim que tomou conhecimento da situação de India Mbotyra Tupã, para buscar o material e levar até a Casa Rosa, órgão responsável por encaminhar para o laboratório em Vitória para a realização do exame histopatológico. “A SEMSA destaca ainda que a indígena pode procurar os serviços de psicologia e assistência social oferecidos pela Casa Rosa”.
E a SEMSA completa a nota sobre o caso específico:
“A Casa Rosa da Prefeitura de Aracruz conta com uma equipe multidisciplinar com profissionais da saúde, entre eles, médicos ginecologistas, enfermeiras, técnicas em enfermagem, psicóloga, nutricionista e assistente social. O espaço fica localizado em frente ao Mercado Municipal. O atendimento se dá por encaminhamento feito pelas unidades básicas de saúde conforme a natureza da demanda”.
Já em relação aos cuidados com as aldeiras indígenas, A SEMSA afirma que atua de forma suplementar.
“A Secretaria de Saúde oferece apoio complementar às ações de saúde indígena desenvolvidas pela Secretaria Especial de Saúde Indígena, ligada ao Governo Federal. O órgão federal é o responsável por coordenar e executar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas e todo o processo de gestão do subsistema de atenção à saúde indígena (Sasi-SUS)”.
VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
No ano passado, projeto de autoria das vereadoras Dileuza Marins Del Caro e Mônica Cordeiro sobre violência obstétrica chegou a receber veto do prefeito Jones Cavaglieri, mas a Câmara o derrubou e atualmente o município conta com legislação pertinente à forma como devem ser tratadas as gestantes, parturientes e mães que acabaram de sofrer aborto.